Na vida em sociedade é de suma importância que as pessoas estejam
dispostas a fazer concessões, a serem flexíveis diante das demandas
profissionais, familiares, de amigos e dentre outras que surgirem. Ser
uma pessoa complacente e tolerante sem dúvidas facilita o convívio
social, porém, não se pode deixar que esse comportamento
benevolente se transforme em uma submissão exacerbada.
É comum ouvir as pessoas se queixarem de sentir dificuldade em dizer
“não” nas diversas solicitações que surgem no cotidiano, esse
comportamento ultrapassa o campo da benevolência e revela uma
lastimável falta de cuidado pessoal. Aceitar estar em situações ou fazer
coisas que trazem desconforto para si, por não ter a firmeza de negar,
pode desencadear consequências negativas para a vida do indivíduo
que se coloca neste papel.
Para compreender melhor o que está por trás desse comportamento
nocivo, é pertinente refletir sobre as premissas básicas da psicanálise
proposta por Sigmund Freud do que é o “inconsciente” e os “atos
falhos”.
A teoria psicanalítica sugere que a consciência é uma condição
intrínseca a mente humana, é a função neurológica que permite a
percepção do mundo exterior, a distinção das sensações de prazer,
desprazer e sentimentos. A consciência é a capacidade do ser humano
de atribuir significados aos símbolos e representações que lhe são
expostos. Ou seja, a atribuição de sentido as coisas se dá de forma
espontânea, e deriva de toda a experiência e conhecimento adquirido
pelo indivíduo desde a sua primeira infância.
Já o inconsciente humano, apesar de também se manifestar de forma
espontânea, consiste em um conjunto de representações, desejos, e
impulsos que o indivíduo “expulsa” da consciência ao longo da vida, mas
que se manifesta subliminarmente através das ações, palavras, gestos.
Ou seja, é no inconsciente que se encontra o motivo que a pessoa se
sente constrangida em dizer não.
Deste modo, entende-se que o indivíduo que se coloca frequentemente
em uma posição submissa nas suas relações, aceitando situações
degradantes para si, passou por processos psíquicos de ordem
inconsciente ao longo da vida que o fazem agir dessa forma.
O ato de abdicar do próprio desejo para não desapontar o outro
demonstra que há nesse sujeito uma necessidade eminente de
aprovação alheia, medo de rejeição, falta de autoconfiança e
insegurança. Esses sentimentos se acumulam no inconsciente de forma
gradual ao longo da vida, e é necessário refletir e procurar ajuda
profissional para tomar consciência e mudar de atitude.
É muito provável que essa necessidade de aprovação seja derivada da
relação com a família, amigos ou escola, desde a infância. Não é
incomum que os pais depositem expectativas nos filhos e os tornem
objetos do seu próprio desejo, impedindo que esta criança exerça
plenamente a sua individualidade, que é tão necessária para a formação
de um adulto autoconfiante.
No viés da psicanálise, esse comportamento lesivo para si próprio é
denominado “ato falho”. Entende-se que os atos falhos são, na verdade,
desejos inconscientes. Ou seja, nesse caso, o desejo inconsciente do
indivíduo é a aprovação do outro, o que faz com que ele tome o ato falho
de dizer “sim” ´para situações que não lhe são favoráveis.
A dificuldade de dizer “não” pode se manifestar em diversas
circunstâncias, como: comprar uma coisa que não deseja por conta da
insistência do vendedor; não questionar se alguém “furar” a fila; não
reclamar com pessoas sendo inconvenientes no cinema; aceitar estar
sobrecarregado no trabalho; ou até se submeter a uma relação sexual
indesejada.
Muitas são as formas de desgaste emocional que a persistência no ato
falho causa, contudo, se estiver atento a ele e tomar consciência, pode
ser a solução para muitos problemas pessoais.
Os atos falhos são a chave para muitas questões que estão mal
resolvidas em quem os faz, e que muitas vezes há uma tentativa de
mascarar e permanecer no inconsciente para provar para si que está
tudo bem. É preciso dar atenção e importância a estes atos pois eles irão
revelar o que é preciso mudar para interromper de vez, e de forma
consciente, as atitudes auto lesivas.
